terça-feira, 30 de março de 2010

A revolução hoje


Olá,
No jornal PÚBLICO de 25 de Abril de 1999, o editorial tinha como título “Para a Maria”, a propósito da comemoração dos 25 anos da revolução de Abril. Uma edição especial em que a capa era a foto de um bébé nu deitado numa “cama” de cravos encarnados. Curiosamente e na mesma edição é anunciada a morte da bisavó da Maria. Ou seja, na mesma edição a vida dá lugar à morte. Duas coisas naturais. Coincidências...
Passaram-se 10 anos e a Maria escreve,

As cerejas da Dona Amilda - A dona Amilda era já uma pessoa de idade, daquelas que sabem tudo, que têm sempre razão porque já viveram e reviveram a vida. Mas ela era diferente, tinha um humor que nos fazia rir, uns cabelos que, brancos como a neve, brilhavam ao sol, umas rugas na cara que lhe davam o aspecto sábio que tinha e usava sempre um sombreiro com duas cerejas. A dona Rosa, sua vizinha, não percebia porque é que a dona Amilda tinha um gosto especial a cerejas no sombreiro, (a dona Rosa só gostava de tangerinas, lírios e cravos) e perguntava: - Porquê Amilda, porquê cerejas, porque não cravos? Mas o que a dona Rosa não sabia é que o coração da dona Amilda era como um cravo, um cravo da liberdade, que lhe dava a liberdade de escolher cerejas, talvez para lhe relembrar a infância, quando punha um brinco de cerejas nas orelhas para mordiscar pelo caminho. Mas na sua infância (quando era criança, tinha uns olhos castanhos que mostravam esperança, uma face macia e um cabelo que também castanho, lhe dava pelos ombros) comia cerejas porque, como qualquer outra criança lhe sabiam bem.
Passou-se mais um ano e a propósito de uma visita de estudo à Assembleia da República, foi pedido à Maria que comentasse o que tinha visto. Achou que “lá não se entendem, gritam muito e tratam-se muito mal uns aos outros e que aquilo não leva a lado nenhum e não é bom nem para eles nem para o país” – palavras dela.
A Maria distingue naturalmente o bem do mal. Com uma mente curiosa e perspicaz a Maria sabe que o que é a liberdade e a liberdade de expressão. Usa naturalmente o computador, a internet e o telemóvel. Por vezes ajuda o irmão a fazer os trabalhos de casa no “Magalhães” e pirateia músicas do computador para um aparelho do tamanho de um dedo mindinho. Ela é o somatório da educação escolar , da educação familiar e da educação social contemporânea.
Ouvir a Maria com atenção é meio caminho andado para reencontrar a sanidade mental. A Maria irá desenvolver, por acumular de informação e conhecimento, uma capacidade crítica menos inocente, ou não. Mas por ora essa inocência está mais perto da verdade e não cair na tentação de manipular o que ela diz e pensa é um exercício que me cabe a mim, enquanto pai da Maria.
No entanto o futuro é brilhante. Disso não tenho dúvidas.

Beijinhos e essas coisas

quarta-feira, 24 de março de 2010

Os amigos reais

Olá,

Há tempos recebi em minha casa um amigo.
Eu talvez seja muito exigente com a amizade mas o facto é que não tenho muitos amigos. Uma vez, no facebook, vi alguém com cinco mil e tal amigos. Credo. Deve ser difícil gerir tantos amigos.
Este amigo já lá foi a casa em outras ocasiões mas desta vez comentou que nunca viu uma tão arrumada e limpa como a minha. Nem casas de mulheres, disse, que eu sou mais limpo e arrumado do que elas (ele é técnico/canalizador do gás, portanto conhece muitas casas). Fitei-o, olhos nos olhos na tentativa de perceber alguma ironia ou sarcasmo, mas nada. Aquilo saíu-lhe do coração. Um misto de admiração e constatação.
Ele é um jovem, trabalhador e honesto na casa dos trintas e poucos. Ainda vive com os pais. O que não é não é vergonha nenhuma mas antes pelo contrário, pode ser uma opção formidável. A família ainda é em Portugal um pilar da sociedade. Se ele sabe com quem contar sempre, é com os pais. Acabam por se ajudar mutuamente. Convivem, conversam e apoiam-se. É bom.
Ainda no outro dia vi nas notícias - "Jovem de 30 anos sai do coma em que se encontrava há vários meses". Por outro lado e no mesmo noticiário - "Dois homens aparentando vinte e poucos anos assaltam ourivesaria usando extrema violência". É curioso a versatilidade da idade de um homem. Se sai do coma com 30 anos é jovem. Se tem 20 anos e assalta uma loja é homem. Vá-se lá entender. Adiante.
Sou civicamente divorciado. Tenho dois filhos que vivem com a mãe, foi o acordo a que chegámos. Sou um pai que só está com os filhos de 15 em 15 dias. Não foi fácil. Tive de me habituar. Há dias vi na televisão um ex-colega meu, e conheço-o muito bem, dizer com um grande conhecimento (acha ele) que tem montes de amigos na minha situação e que para eles é muito cómodo. Era no canal SIC Mulher e ele, que não tem filhos, disse o que disse porque basicamente é um imbecil que estava num programa de mulheres. Compreendes onde quero chegar? Tem a mania. Estúpido! Ele sabe lá o que é "perder" a mulher e os filhos tudo de uma vez num divórcio. Claro que não se perde. Mas no fundo habituamo-nos a viver com a dor de não podermos viver com os filhos. E a entrevistadora e as outras parvinhas estavam deslumbradas a olhar para ele. Sabe muito o malandro. É mais um Zézeca Marinha é o que é, pago para ir para a televisão dizer alarvidades. Adiante.


Ora porque é que eu tenho a casa arrumada? Porque sendo desarrumado, simplifico ao máximo e assim desarrumo menos. Porque quando mudo de casa dou tudo o que me é supérfulo (os discos de vinil por exemplo dei-os à Rádio Marginal. Só me ocupavam espaço e eles ficaram todos contentes). Tenho a casa arrumada e limpa porque estou sempre à espera dos meus filhos. Porque sou daqueles homens que lava a loiça a seguir às refeições em vez de deixar para o dia seguir. Porque não uso fatos nem gravatas nem camisas que precisam de ser passadas a ferro. Aliás na minha casa não há ferro de engomar. Quando penduro a roupa estico-a logo. E quando dobro a roupa dos miudos, fica em cima da cómoda e eles que a arrumem que eu não mexo nas gavetas deles. Manias.
Acho que foi isso que ele terá visto ou sentido. Nesse dia, enquanto eu lavava a loiça na cozinha ele ía adormecendo no sofá da sala. Sente-se confortável na minha casa e isso é bom. Não é o primeiro aliás, que adormece no sofá. Agora que penso nisso... vai na volta é do chá.

Beijinhos e essas coisas,

terça-feira, 16 de março de 2010

Os três pasteis de nata

Olá,
Há tempos fui convidado para uma reunião num ministério.
Chego antes da hora. Gosto de chegar sempre antes da hora. É bom. Dá-me tempo para concentrar e relaxar. Fico mais desperto e consciente.
Dirijo-me à contínua e pergunto se é ali que vai ter lugar a reunião. Responde-me que sim e pergunta-me o nome. Não consto na lista. Não consto como? Fui convidado, ora essa? Ela faz um telefonema e diz-me para eu esperar. As pessoas que vão chegando constam na lista. A reunião já devía ter começado há meia hora. Chega uma senhora que leva os convidados, escada acima, corredor adentro, para uma sala. Eu sigo-os. Tem uma janela com vista para a Praça do Comércio. Como seria interessante ter a praça cheia de restaurantes e esplanadas. Como em Veneza, sabes?
As mesas encostadas umas às outras formam um rectangulo. As cadeiras estão dispostas de acordo com os blocos, as canetas, as garrafas de água e os nomes dos convidados. O meu não consta. Puxo de uma cadeira e sento-me entre dois blocos. Estou curioso em saber porque o meu nome não consta na mesa. Esperamos mais cinco minutos. A pessoa que convocou a reunião aparece e pede desculpa pelo atraso. Também lá tem o nome dela. A reunião começa.


Enquanto a reunião decorre penso porque é que o meu nome não constava na lista da contínua nem nos marcadores sobre a mesa, afinal de contas eu fui convidado formalmente. Uma carta e tudo. Coisa à séria! Reparo que todos os marcadores estão identificados com Dra x e Dr y. Espera! Talvez seja por eu não ser Dr. Naaaa! Preconceito meu.
A dada altura faço sinal para intervir. Faz-se silêncio. Se calhar é por não saberem o meu nome, penso, e apresento-me. O silêncio mantém-se e eu digo o que tenho para dizer. Tem a ver com a quantidade de pasteis de nata que estão a estipular por pessoa no evento que vai decorrer dali a uns dias. Esse é, aliás, o motivo da reunião - a preparação desse evento. Ora ao dizerem que só levam dois pasteis de nata por pessoa, eu reclamo que se forem bons eu cá vou comer três. Ai mas isso é que não pode! – respondem-me. Ora essa! – respondo eu - Isso é que era bom. Se forem bons a ver se eu não como três! E pronto. A reunião ganhou animo. É giro. No final acordaram dois pasteis de nata por pessoa.
No dia do evento está um mar de gente. A primeira e segunda fila de cadeiras estão identificadas com o nome dos convidados especiais. Eu sou um deles. O meu nome não consta mas sim a marca que é minha e represento. Menos mal. Enquanto o conceituado pianista toca, as pessoas conversam. A seguir a doutora fala. O doutor fala. O ministro doutor fala e agora os convidados que fazem parte do projecto são chamados um a um para subirem ao palco e receberem uma oferta simbólica...
- Em representação da empresa x (a minha) chamo ao palco o arquiteto tal (eu).
Ora nem sou arquiteto nem o nome que disseram era o meu. Subi ao palco, dirigi-me à senhora doutora e disse-lhe ao ouvido a sorrir para que ninguém notasse – vocês não há maneira de dizerem o meu nome. Ela corou. Muito! Dirigi-me ao ministro dei-lhe um passóbem e vim-me embora não sem antes aviar três pasteis de nada.
Tive uma estranha sensação de liberdade.

Beijinhos e essas coisas

terça-feira, 9 de março de 2010

O contrato de vão de escada

Olá,
Em oito dias celebrei um contrato com a PT para a instalação da MEO Fibra. Passados oito dias cancelei o contrato com a PT. Nem chegaram a instalar nada.
Tudo começa no dia 10 no vão da escada do sexto andar quando ía para entrar no elevador. A PT aborda-me para me questionar se eu estou interessado na aquisição da MEO Fibra. Escuto o que a PT tem para me dizer. Faço algumas perguntas muito objectivas e compreendo que existem vantagens. Celebramos e assinamos o contrato.
Marcamos a instalação para dali a oito dias.
O que é que se passou nesses oito dias que me levaram a cancelar o contrato?
Aqui segue o mais objectivamente possivel:
Dia 10 - Depois de ter celebrado o contrato, a PT passadas algumas horas liga-me para o telemóvel a confirmar que tinha estado comigo. Eu confirmo.
Dia 11 - A PT liga-me para o telemóvel a confirmar o que já tinha confirmado no dia anterior. Eu confirmo. Mais tarde recebo uma mensagem no telemóvel com o seguinte texto: MEO Fibra: Obrigado pela sua adesao. A sua instalacao sera no dia 18-02 entre as 14:00 e as 15:00. Para mais informacoes ligue 800208344. Obrigado e ate breve.
Dia 13 - A PT liga-me para o telemóvel para confirmar a celebração do contrato. Volto a confirmar.
Dia 15 - A PT liga-me para o telemóvel para confirmar a celebração do contrato. Eu confirmo. De seguida, e por via das dúvidas, eu ligo para a PT do telefone fixo a confirmar que a instalação vai ter efeito. Tenho de confirmar outra vez tudo o que eu já tinha confirmado e sou informado que a instalação demora entre quatro a seis horas.
Dia 17 - Recebo nova mensagem da PT para o telemóvel: MEO Fibra: Obrigado pela sua adesao. A sua instalacao sera no dia 18-02 entre as 14:00 e as 15:00. Para mais informacoes ligue 800208344. Obrigado e ate breve.
Dia 18 - Dia da instalação. Às 14h30 a PT liga-me para o telemóvel a avisar que ía chegar mais tarde. Pelas 16h00 a PT liga-me a perguntar se a PT já chegou e se a instalação está a correr bem. Informo a PT que a PT ainda não chegou. Pelas 16h30 a PT chega. Sou informado que as informações que a PT me deu na altura do contrato não estão corretas. Basicamente, o que a PT me informa é que a PT me mentiu sobre as condições de instalação e que se eu tivesse quaisquer duvidas o melhor seria não fazer a instalação neste dia.
Dia 19 - A PT liga-me para o telemóvel a perguntar como correu a instalação. Eu peço para cancelar a mesma. A PT quer saber porquê e eu explico que não me sinto confortável com o decorrer do processo. A PT agradece e pede desculpa. À noite a PT liga-me novamente para o telemóvel para saber como correu a instalação. Eu explico à PT que já falámos sobre esse assunto e que já cancelámos o contrato.
Dia 20 - A PT liga-me para o telemóvel a perguntar-me se fiquei satisfeito com a instalação do Meofibra. Eu respondo mais uma vez que já cancelei o contrato e se a PT se tinha esquecido? A PT informa-me que não tinha qualquer informação no sistema. Pede-me para eu aguardar. Passados uns minutos a PT informa-me que não voltarei a ser incomodado e pede desculpa.
Todos os telefonemas que a PT me fez e todas as mensagens que enviou foram para o meu telemóvel da rede Vodafone.
Em todo este processo a PT nunca se fez representar pela mesma pessoa. Tabalha muita gente na PT. Ufa!



Agora compreendo aqueles anúncios que os Gato Fedorento fazem para a PT em que nenhum dos personagens do suposto "Caminho das Estrelas" se entende. São aquelas piadas muito à frente. Eu levo mais tempo para as entender, só isso.
Por outro lado fui ao cinema e lá estavam eles, antes do filme, a explicar como só eles sabem que a MEO que tu eventualmente tens há menos de seis meses já está ultrapassada. Que agora há uma nova MEO melhor que a MEO antiga.
Isto não pára.

Beijinhos e essas coisas,

segunda-feira, 8 de março de 2010

Stórias para crianças

Olá,

Há dias fui a uma estação dos correios entregar umas encomendas para serem enviadas para pessoas que gostam de coisas boas como por exemplo as Almofadas RICOXETE de Caroços de Cereja :-)
Nada demais. Costumo fazê-lo numa base diária. Ainda bem para mim. Eventualmente tu tens a tua cota parte de responsabilidade pelas minhas idas aos CTT e desde já aqui fica o meu agradecimento, mais uma vez.
Nessa ida específica de que te vou falar, a diferença foi que fui com os meus filhos. Sempre que posso levo-os comigo no meu dia a dia normal. Gosto que eles vivam a minha vida pois presumindo eu que tenho uma vida relativamente normal será positivo para eles que me acompanhem e me conheçam e observem ou sintam como é possivel viver-se bem em sociedade sem se ser rico nem se ter necessidades loucas nem nos deixarmos levar por todos os apelos que nos fazem, ou seja, o pai. Isto dá para outro texto, portanto adiante.
Como te dizia, estava eu na estação dos CTT com os meus filhos. Mais uma vez. À espera. Contei-te que foi numa dessas estações dos CTT que comecei a ler o Caim do Abel, não contei? Ouve, à borla! Eu acho espectacular. Posso ir para uma estação dos CTT e ler um livro à bolra. Quem diria. E nas bombas de gasolina também. Uma pessoa está à espera e pim, lê um livrito. E no supermercado. É bestial. Lá estou eu a divagar, desculpa.
Só mais esta. Não aguento. Tu sabias que os CTT lançaram um serviço de telemovel, ou lá o que é, chamado Fónix? FÓNIX, pá. Tu acreditas nisto? FÓÓÓÓ... NIXXXX. Pelo amor de Deus. Ainda me vêm com o acordo ortográfico.
Estávamos portanto nós os três dentro da estação dos CTT e o meu filho Manuel chama-me. O Manuel tem oito anos.
- Ó pai. Chega aqui.
- Diz.
- Olha lá a capa deste livro.
E eu li em voz alta,
- Histórias para crianças.
Mas o que estava lá escrito era Estórias para crianças. E mesmo ao lado desse livro estava outro que tinha escrito Histórias para crianças. Ou seja na mesma prateleira, um ao lado do outro, estavam dois livros que apresentavam duas hipóteses de se ler a mesma coisa mas com letras diferentes. E o meu filho diz,
- Ó pai. Eu escrevo história com h. A minha professora diz-me que é com h.
Ouve eu sei que é dificil mas tenta acompanhar, que para mim também não é fácil. Já vais perceber.
Peguei no livro em questão, o que tinha escrito "Estória para crianças" e abri-o. Não vais acreditar! Lá dentro tinha escrito logo na primeira página - vê se entendes - "Proibida a publicação no Brasil". Assim. Sem espinhas. A seco. Eu nem percebi o que é que aquilo quereria dizer. Mesmo assim...
- Ó Maria, chega aqui. Já viste isto? Se calhar isto é tão parvo, tão parvo que eles lá no Brasil nem querem ter lá estes livros por causa da maneira como escrevem histórias. O que é que achas?
- Sei lá pai. Eu cá escrevo com h.
- Mas se a tua professora de português ou outra qualquer te disser que não é assim o que é que tu fazes?
- Não sei.
- E tu Manuel?
- Eu escrevo sempre com h. Foi o que a professora me disse.


- Olhe, desculpe. Peço desculpa estar a meter-me na conversa mas posso dizer uma coisa ao seu filho? - as pessoas não aguentam. Aquilo está-lhes na garganta. Têm que dizer alguma coisa. É giro.
E o que a senhora em questão quis dizer não me lembro bem. Ela era gira, com cabelo comprido e com um ar ótimo. Com botas finas, calça de ganga, um blusão de pele. Uma mulher bem tratada, com uma voz muito bem colocada e segura. Nem gorda nem magra. Com as mãos impecavelmente arranjadas. Não me lembro e deve ser por isso - era gira. Mas sei que ela estava a concordar com a minha perplexidade acerca do assunto. Acho que era professora. Disse que queria dizer qualquer coisa ao Manuel mas foi a mim que se dirigiu. Para me dizer algo do género que no fim se resume a "isto está uma confusão que ninguém se entende".
Logo a seguir um tipo que também estava a ouvir a conversa começa também ele a comentar que tinha filhos e que também não sabia o que fazer e que mais isto e que mais aquilo.
Enfim. Foi para ali um sururo. Nem imaginas. Deixámos a Estação dos correios e as pessoas a discutir o assunto.
Quando já estávamos no carro de volta para casa eu o os meus filhos chegámos à conclusão do seguinte.
- Ó Manuel, é melhor escreveres como diz a professora. Se no ano a seguir outra professora te disser para escreveres de outra maneira escreves como ela disser e assim nunca vais ter problemas.
- Mas...
- Mas nada! Lá na escola escreves sempre como elas dizem e tás calado. Se tiveres problemas dizes-me que eu vou lá falar com elas.
- Mas...
- Ai!...
- Está bem.
- Eu dou-lhes o acordo. Acordam mas é logo. Que maçada... Olha! Olha ali! Estão a ver aquele ali do carro cinzento? Vai a falar ao telémovel. Toda a gente fala ao telemóvel quando conduz e eu é que fui apanhado. Que lei tão estúpida! Até já vendem carros com GPS, televisão e tudo. Bolas.


Beijinhos e essas coisas,

O atendimento permamente

Olá,

Há tempos estava eu a fazer o meu jantar. Hamburgueres com massa. Achas banal? Havias de ver a confeção. Estava que era um mimo. Como te dizia estava eu a fazer o jantar e coloquei a comida no prato. O prato no tabuleiro. Fiz um chá, que eu gosto de beber chá às refeições. É cá uma mania minha e não me venhas com coisas. Já pensas-te a quantidade de chineses e muçulmanos e hindus que bebem chá quente às refeições. Se pensares bem são muito mais humanos que bebem bebidas quentes às refeições do que aqueles que bebem bebidas frias. Mas é bom, sem duvida. Só que chá quente é ainda melhor. É uma questão de hábito. Imagina que és um estômago e estás quentinho e confortável a receber uma bela comidinha muito saborosa e essas coisas boas. De repente e sem que nada o faça esperar, pás, um banho de água gelada. Gostas? Não pois não? Agora imagina o teu estômago. O desgraçado, ele é calor e frio e depois calor e frio e por aí fora. E às vezes ainda com gás. Eu nem sei como é que é possivel. De facto o corpo humano tem uma capacidade de aguentar maus tratos a toda a prova. Adiante.
Sento-me no sofá e sorvo a comida. Estava cheio de fome e aquilo estava mesmo bom. Como estava cheio de fome fiz dois hamburgueres com alho e essas coisas boas. Estava divinal, afianço-te. Para quem gosta claro. Bebo o chá e pronto, já jantei. Agora o chocolate. Eu como chocolate à séria. Sei que tenho um problema grave com o chocolate. Provavelmente irei ter diabetes ou outra coisa assim do género. É impossivel que não tenha nada por comer tanto chocolate. De certeza. Pode ser que não. Mas se tal não acontecer é só por uma questão de sorte. Só. No fim um cafézito daqueles das cápsulas às cores e pronto.
Levanto-me. Lavo a loiça, arrumo a cozinha e volto para a sala. A certa altura comecei a sentir-me mal disposto. Algo no estômago me estava a incomodar. Tu queres ver que foi do chá, pensei. Só me faltava mais esta. Liguei a alguém que me disse - bebe coisas com gás. Bebi uma Coca-cola com gás... fria. Não deixa de ser curioso... Mas nada! A indisposição deu lugar à dor. Fui andar. Apanhar ar e fumar um cigarrito. Talvez me faça bem, pensei. Mas não. A dor instalara-se e cada vez mais acutilante. Ora bolas. E eu aqui sózinho. Que horas são? Meia noite e meia? Talvez passe, desejei. Vou esperar mais um bocado. Às quatro da manhã levanto-me a custo, torcido de dores no estômago e resolvo meio curvado meter-me no carro e ir até à Clínica do Parque dos Poetas em Oeiras. Eles têm atendimento permanente. Vou lá. Até tenho o cartão Multicare. Siga.
No caminho julguei mesmo que me ficava ali no meio da estrada. Finalmente a Clínica. Em letras garrafais e luminosas no topo do edifício - ATENDIMENTO PERMANENTE. Estou safo, e a esta hora não está lá ninguém. Fixe, pensei. Estaciono o carro e reparo que o meu carro é o unico. Que sorte do caraças pensei. Isto vai ser formidavel. Saiu do carro e dirijo-me a cambalear para a porta da clínica. Aquilo tem portas automáticas de correr para os lados que eu sei pois já lá tinha ido em tempos à tarde por outros motivos. Por pouco não enfio com a cabeça no vidro. As portas não abrem. Ao lado das portas de vidro que abrem, nos vidros fixos, num dos lados, uma folha de papel A5 tem escrito - ATENDIMENTO PERMANENTE DAS 09H00 À MEIA NOITE.
Procurei uma farmácia de serviço. Expliquei o que tinha. Dores de barriga. Comprei o que me recomendaram e voltei para casa. Tomei aquilo dissolvido em água e agora é que vou mesmo morrer. Que ingratidão. Aquilo ainda me fez ficar pior. Liguei para o 112. Pela primeira vez na vida. Não acharam que fosse motivo para me levarem ao hospital. Deram-me o número dos bombeiros de Oeiras. Eram seis e trinta da manhã. Pensei, se ainda não morri é porque também não vou morrer. Respirei fundo. Deitei-me novamente.
Se me vêm buscar a esta hora estou tramado no hospital. Nunca mais de lá saiu e ainda me vão convencer a tomar a vacina da gripe A. A mim é que não me dão aquela porcaria. Como é que se chama aquele tipo da Saúde de barbas? Feio como as portas, Deus me perdoe. Veio para a televisão dizer o ano passado que íam morrer milhares de pessoas... em Portugal. E depois foi para a televisão mostrar que tomou a vacina. Mais um que ía directo para a gaiola era o que era. Estúpido. E até houve uma notícia bombástica que eu bem me lembro e qua abriu o telejornal das 20h00 a anunciar a morte de uma senhora com 84 anos possivelmente por causa da gripe A.
Adormeci com dores muito quietinho na posição fetal. Quando acordei pelas onze da manhã doía-me a barriga mas já nada do que tinha tido à noite. Foi horrivel. Talvez uma paragem de digestão. Sei lá. É o mais certo. Tensão acumulada juntamente com a velocidade com que comi o jantar ainda por cima sentado no sofá todo curvado para a frente. Nem o chá quente me safou. Nem a Coca-cola gelada com gás.
Tenho de falar com os meus filhos. Como são novos talvez eles me expliquem o que quer dizer atendimento permanente, que eu estou velho. Já tenho 44 anos e para mim atendimento permanente só quer dizer uma coisa - permanente. Talvez tenha havido alguma alteração no acordo ortográfico e eu não sei.
Beijinhos e essas coisas,
o normal anormal

O homossexual mentiroso ou vice versa

Olá outra vez,

Eu bem tento andar minimamente informado e por outro lado não me deixar levar por tudo o que me vão dizendo ou fazendo crer. Tenho de manter a mente aberta pois tenho filhos novos. Mas... esta coisa dos casamentos gays ou homossexuais ou entre pessoas do mesmo sexo, enfim... este assunto que tem tido tanta cobertura mediática!...
Preciso desde já informar-te que eu sou heterosexual. Porque é que to digo assim desta maneira? Porque me apetece dizer-to. Sou assim. Sou homem e gosto de mulheres. Atenção, gosto de uma de cada vez. Isto anda tudo maluco e se eu te venho falar deste assunto, pelos vistos tão delicado, convém à partida dar-te a conhecer as minhas preferencias sexuais ou lá o que isso queira dizer ou mesmo o que te possa ou não importar. Lembro-me de ter ficado admirado quando há uns anitos o João Soares, então presidente da câmara de Lisboa ter proposto a nossa cidade de Lisboa para capital mundial do turismo gay. Pelo amor de Deus. Esta nossa mania de nos pormos sempre à frente do que quer que seja e julgarmos que somos mesmo os maiores. Também me lembro quando fizeram uma passagem de peões sobre a segunda circular ao pé do Estádio do Benfica e o Correio da Manhã ter noticiado como sendo a maior passagem de peões da Europa. Valha-me Deus outra vez. Há mesmo pessoas muito pequenas neste nosso pequeno país ou estado europeu, sei lá. Adiante. Voltemos à questão do casamento gay, homosexual ou entre pessoas do mesmo sexo. Tanta polémica. Tanto lobbie. Tanta notícia. Tanta especulação. Tanta mentira. Eu pessoalmente acho que para se ser gay, homosexual ou o que quer que seja tem de se ser mentiroso. É uma condição. Senão vejamos.
Imaginemos que eu sou gay. Que gosto do Jorge por exemplo. Eu o normal anormal adoro o Jorge... enfim, suponhamos, atenção! Ora agora imaginemos que eu saio do meu local de trabalho e tenho o Jorge à porta do meu local de trabalho à minha espera. De bigode, fortalhaço e todo giraço e eu, mesmo à porta do meu local de trabalho, espeto-lhe um beijo na boca, dou-lhe a mão e vou com ele todo pimpão almoçar ao restaurante do outro lado da rua. Discutimos a refeição que vamos comer à frente do empregado, comemos, hoje pago eu, adoro-te, dou-lhe umas festinhas na cara com a barba de dois dias, pucho-lhe o bigode, sorriu-lhe, atiro-lhe uns beijinhos e saímos do restaurante repleto de bandeiras do benfica e do porto e dizeres do género aqui não se fia e essas coisas. De seguida e porque ainda me restam uns minutos antes de ir trabalhar vamos passear para o jardim ali ao pé e sentados no banco do jardim falamos sobre coisas do dia a dia. Chega a hora de voltar para o trabalho, ele acompanha-me até à porta e despedimo-nos com um beijo apaixonado. Bigode contra barba de dois dias, essas coias que não me apetece imaginar mais e muito menos descrever. Já te disse que o meu local de trabalho é... por exemplo a fábrica de cabos eléctricos para automoveis ou das farinhas Triunfo. Sei lá, imagina assim uma coisa dessas. Ora bem. O que é que achas que me podia acontecer? Nada claro. Não me acontecia nada. Nadinha. Na sociedade portuguesa este tipo de situação é perfeitamente vulgar. É o que mais para aí há é casais gays, homosexuais, do mesmo sexo a conviverem livremente como se fosse uma coisa normal. Claro que não! A nossa sociedade, e não me refiro à portuguesa mas sim à sociedade ocidental está assente no pressuposto que um casal compreende um homem e uma mulher. Por mais que os orgãos de opinião pública queiram fazer crer o contrário ou outra coisa (vá-se lá saber porque é que esses orgãos estão sempre a fazer coberturas sobre o assunto) o facto é que as coisas são como são. Mesmo que a igreja tenha casos de pedófilia (que não tem nada a ver com este assunto) mesmo que a Casa Pia não se resolva (e também não tem nada que ver com este assunto) mesmo que se especule que metade dos deputados da assembleia sejam gays, homosexuais ou o que quer que seja a verdade é que a nossa sociedade não é nem será tão cedo assim. Aberta a estas modernices de casais do mesmo sexo.
E agora o que eu penso mesmo: ó pá desde que um tipo ou uma mulher não vá para frente do parlamento dizer que se quer casar com um elefante, por exemplo, ou uma ovelha, ou um sapo, sei lá. Estás-te a rir? Eu há gente para tudo, pá. Cá por mim porque é que não se hão-de poder casar? Isto é que me intriga. Quem é que tem poder para dizer se eu e o Jorge (tomando como exemplo fictício) não nos podemos casar? Essa é boa!? Ai é por causa da igreja! Ó pá não me lixem. A igreja? Olha que rico exemplo. Nem me vou debruçar sobre ele. Só de pensar que Jesus andou metade da vida só com os amiguinhos dele e de mão dada. Todos de barba e de mão dada. Ora bolas. Dizem, não sei. Dizem que teve um filho de uma prostituta. Reparem, a mãe do Jesus diz de pariu um filho dum espírito, o que faz do José carpinteiro (o pai) o quê? Pai adoptivo? Padrasto? E depois para mal dos pecados do José, o filho, Jesus só se dá com homens e a ter um filho cre-se que é de uma menina duvidosa tatuada dos pés à cabeça? Ai é por causa da questão legal. Qual questão legal? Mas qual questão legal? Ainda que me dissessem que era porque depois íam adoptar crianças e era uma confusão lá na escola quando perguntassem o nome da mãe e do pai, que é normal perguntarem. Enfim... pôe-te no lugar da criança. Já por ser cheinho é logo apelidado de gordo, ou por ser baixote é rodinhas, ou por ter uns dentes grandes é favolas, imagina se tinha dois pais ou duas mães.
Repara, eu pessoalmente não me interessa absolutamente nada quem pretenda optar por esse tipo de situação, mas se o meu filho com oito anos resolve (e ele é uma pessoa muito bem educada e não esperaria que fizesse isso) resolvesse gozar com um colega por esse motivo, eu era o que mais me faltava ser chamado à escola porque a professora me ía chamar a atenção por causa do meu filho ter dito o que quer que fosse sobre o colega. Que culpa é que os míudos têm de ter nascido nesta sociedade. Se o outro não tem culpa de ter dois pais homens o meu também não tem culpa de ficar cismado com tal situação. Talvez chegue mesmo a pensar: coitado, não tem mãe? ou vice versa. Haja respeito.
As pessoas que se casem como muito bem entenderem e com quem quer que amem. Ninguém tem nada a ver com isso. Nem eu. Era o que mais me faltava. Eu quero lá saber. Os meus amigos ou amigas já chega de se colocarem nessa situação de vítimas do sistema. É que eu não tenho nada a ver com isso. Não tenho mesmo. E julgo não estar só. Ainda se chateiam com o Saramago por ter chamado filho da p... a deus. Pois eu também chamo! De resto nunca me ocorreu que Deus fosse filho de alguém, não é? Quando muito ele é... pai?... mãe? criador? de todos nós. Agora quem é que o fez? Sei lá. Tu sabes? Se calhar foram dois Jorges que o adoptaram. Ou duas Marias que combinaram ficar uma delas grávidas por inseminação artificial para terem um filho especial educado por duas mulheres. Bolas. E depois saiu-lhes Deus.

Tanta coisa para discutirem na Assembleia... tanta. Mas tanta.

Beijinhos e essas coisas,

O xenófobo

Há tempos fui às compras. Estava desempregado e andava mal com o mundo. Enfim... tu sabes. Ou se não sabes melhor para ti. Mas o facto é que fui às compras ao Continente. Ao entrar não contava comprar tantas coisas e portanto estava eu na fila para pagar e pensava para comigo. Estas miudas das caixas nem imaginam o que lhes vai acontecer. O tio Belmiro está a preparar-se para meter aqui uma porcaria de umas máquinas e é só passar com os carrinhos debaixo da ponte e os artigos são todos escrutinados e no fim é só pagar com o cartão mágico. Elas vão ver.
Mas também que raio de trabalho que estas miudas têm. Sentadas uma data de horas aqui a levar com o povo. E a passar tudo naquela luzinha lazer que ainda por cima deve fazer-lhes mal como o raio. Coitadas. Esta até é girinha. Se calhar anda a estudar e está aqui a fazer turnos. E ainda por cima devem-lhes pagar mal como a porra. O tio Belmiro é que deve estar cheio dele. E agora é o filho. Se o meu pai fosse o Belmiro é que era. Eu não estava aqui nesta fila. Podes crer.
E isto que nunca mais anda. E este tipo aqui à minha frente deve ser maluco. Deve ser mesmo. Tem um carrinho para levar um "pacage" de seis cervejas. O tipo é doido. E eu aqui com as compras e sem carrinho. Ainda por cima deixei o carro no menos dois. Acho que foi no vermelho. Ora bolas. Vou ter de levar os sacos até lá baixo. Se calhar o melhor é deixar o garrafão da água aqui. Estes sacos cortam os dedos e daqui até lá baixo vou ficar com os dedos em sangue. Que maçada. Já não dá tempo de ir buscar um carrinho. É mesmo lá ao fundo. Mas que porra.
Tenho mesmo de dar a volta à minha vida. Com esta idade e a receber o subsídio de desemprego. Isto não é nada. Que porra. E aqueles ali a rirem-se. Eles haviam era de se rir se estivessem na minha situação. Isso é que era. Ainda por cima são brasileiros. Só me faltava mais isto. Agora é só brasileiros. São mais que as mães. Isto é a paga por termos colonizado o Brasil. Nunca à bela sem senão. Fomos para lá escravizá-los e tratá-los mal e agora estamos a pagar. Vai na volta a menina da caixa é brasileira. Eu nem acredito só me faltava mais esta. Isto está minado. Se eles continuarem a vir a este ritmo para cá estamos bem tramados. Já bem bastava os pretos. Depois os russos e os ucranianos. E os chineses? Esses nem sequer se sabem rir. Vais ver o que vai acontecer aos americanos quando os chineses lhes pedirem contas. Vai ser giro. Eles já tomaram conta do continente africano. Isto para eles é peanuts. O meu avô é que tinha razão se os chineses se lembrarem de espirrar todos ao mesmo tempo para este lado a malta cai toda ao mar.
... Olha!? Então mas este gajo é brasileiro? Para além de maluco é brasileiro. Mas que sorte a minha. Deixam cá entrar tudo. Havia de ser comigo. Era uma canoa e sem remos. Tá andar.


- Ó cara! Cê qué o carrinho? Não tem moedinha. E você tá carregando para caramba. Toma, pega.
- Hã? Não. Deixa estar. Não é preciso.
- Ó cara. Pega o carrinho. Não tem problema. Vai. Fica bem.
- Não é preciso obrigado.
- Vai. Cê tá carregando muito. Eu não preciso. Tá vendo?
- Está bem. Obrigado.

Toma! Toma! Toma! Parece que sou estúpido... e parvo que nem um cabaz de compras. Eu devia era levar com uma tábua na cara e era pouco.

- Quanto é? Sim, sim, vou pagar com o cartão.
Beijinhos e essas coisas,

Opção de multa

Fui multado. Bolas!

Desta vez foi forte. Vésperas de Natal. Lisboa. Campo Grande. Vinha com os meus filhos da Casa Ronald Macdonald. E entusiasmado com o que tinha acabado de fazer com os meus filhos liguei à minha mãe.

- Estou mãe?... Sim. Tudo bem... Estão comigo. Digam olá à avó.
- Olá avó.
- Sim estão bem. Sabe de onde venho? Nem imagina. Da Fundação Ronald Macdonald, já ouviu falar? Isso. Sim. Fica ao pé do Hospital Dona Estefânia. Sim esse. Ó mãe aquilo é mesmo engraçado, depois conto-lhe em pormenor. Sim fomos lá os três entregar umas Almofadas às crianças que lá estão hospedadas. Óh!... Já sabe como eu sou. Sim. A senhora chama-se Sandra e é muito simpática. Foi giro. Ela foi-nos mostrar a Casa Ronald Macdonald. Estavam lá uns miudos doentes. Aquilo é pesado mãe. Cancros e essas coisas. Livra. Deus me livre. Sim. Vi um programa na televisão sobre aquela Fundação e resolvi este Natal ir lá oferecer 21 Almofadas. Então e não quer crer que a senhora diz que me passa um recibo que serve para entregar nas finanças? Ó mãe. Eu agora até sou um mecenas, veja lá. Nem estava à espera. Isto de facto há coisas. Eu estava desempregado e agora sou tão mecenas como a PT ou outras entidades enormes que lá estão representadas na parede da entrada. A senhora até me disse que se eu quisesse ela punha lá o logotipo da RICOXETE ao lado das outras. Não acha formidavel? Diga? Olhem lá, querem ir almoçar a casa da avó?
- Sim. Pode ser.
- Ó mãe tenho de desligar que tenho aqui o polícia a fazer-me sinais para encostar.
- Bolas. Bolas. Bolas. Mas que maçada.
- Ó pai e agora?
- E agora? E agora? Eu sei lá. Tenham calma. Isto não é grave.
- Bom dia sr. condutor. Os seus documentos e os documentos da viatura.
- Os meus documentos e... só um bocadinho... estão aqui no porta luvas. E os documentos da viatura. Estão aqui.
- Ó pai e agora? Tu não trazias o cinto.
- Ó pá eu sei. Nem me digam nada. Que maçada.
- Ora bem, o sr. condutor sabe que deveria ter feito a inspecção do veículo até ao dia 11 do mês passado?
- Não!? Tu queres ver que me esqueci.
- Pois é. E não trazia o cinto. E sabe porque é que o mandei parar?
- Sei sim senhor, porque vinha a falar ao telemovel.
- Pois é. Ora bem. Então é assim. Eu não o quero prejudicar e portanto pode escolher entre ser multado por causa do telemovel ou por causa da inspecção. Se for do telemovel são 120 euros e fica registado na sua carta como sendo muito grave. Se for da inspecção são 250 euros mas não fica registado. Eu sugiro-lhe que opte pela da inspecção.
- Pois. Tem razão. É melhor a da inspecção.
- Faça o favor de sair da viatura e de me acompanhar.
- Ó pai e nós?
- Deixem-se estar que eu estou mesmo aqui.
- Ora faz favor de assinar aqui. Paga agora?
- Pago. Está aqui o cartão mágico.
- O código por favor... Já está. Aqui tem o talão.
- Pronto. Olhe... Obrigado e o resto de um bom dia de trabalho, sim?
- Olhe que você deve ser o unico que foi simpático connosco.
- Pois. Eu compreendo.
- Então olhe... Boas Festas.
- Então pai? Tiveste de pagar?
- Claro que tive. Porra! Porra! Porra! 250 euros. Isto só a mim. Mas que azar do caraças. Vocês ponham mas é o cinto. Que maçada. Ó Manel põe lá a porcaria do cinto. Mas que gaita. E ainda fui simpático para os polícias. Eu sou mas é parvo.
- Ó pai tu já sabias. Afinal não és Formador de Condução Defensiva? Já sabias que tens de pôr o cinto e não podes falar ao telemovel.
- Ó Maria pelo amor de Deus. Vamos lá para casa da avó... Tou mãe? Fui multado. Isto não é justo. O auricular? Tenho. Tenho aqui no porta luvas. Diga? Ó mãe pelo amor de Deus. Vá. Tenho de desligar que vou a conduzir. Até já... Ó Manuel. Já puses-te o cinto?... E depois vendem para aí carros com televisão e GPS integrado e que dão 300 à hora. Isto é o Matrix é o que é... Olha! Olha, olha, olha!!! Estão a ver? Aquele ali vai a falar ao telemovel. Estão a ver? E aquela taxista não leva cinto. Isto só neste país. Os taxistas juntaram-se e ganharam contra o uso do cinto. Isto é a loucura dentro da própria loucura. Mas que azar. Isto não é justo. E nas vésperas do Natal. Só a mim.
- Ó pai não fiques triste.

Beijinhos e essas coisas,

o normal anormal

A validade dos cheques

À tempos, por causa já nem sei bem de quê, precisei de passar um cheque. Um cheque bancário. Repara, eu tenho conta no BES desde os 18 anos. Já lá vai muito ano, porra. O mundo não pára. Nem o meu relógio biológico. Eu bem tentei. Apanhei umas boas bebedeiras que me fizeram não ter qualquer memória de dois ou três dias da minha vida. Adiante. Mas o facto é que nem esses períodos que não me ficaram gravados na memória fizeram com que o tempo tivesse parado. Por mais que eu julgue que tal tivesse acontecido. Tem piada. Não deixa de ser curioso agora que te escrevo isto.

Onde é que eu ía? Ah! Sim! Nos cheques do BES. Pois bem, desde os 18 anos. Sim. Ora bem. E portanto eu precisei de um cheque já nem me lembro para quê. Pois fui à gaveta onde tenho guardado os cheques juntamente com outras coisas que não fazem sentido nenhum estarem juntas com os cheques mas o facto é que sei sempre onde estão. É aquela gaveta. Tem isqueiros, cartões de visita de restaurantes, a caderneta militar (com a minha foto a sorrir - acho que fui o unico do meu pelotão que ficou a sorrir na foto da caderneta militar), uns quantos isqueiros, umas mortalhas e uns filtros - tabaco de enrolar, tabaco de enrolar. Eu próprio nem sei bem porque é que acumulo estes artigos particulares naquela gaveta, mas o facto é que estão sempre juntos. Ainda um dia hei-de perceber ou não, sei lá. Adiante...

Estou sempre a divagar. Que maçada. havia de arranjar alguém para me ajudar. Assim como Saramago que encontrou a Pilar. O tipo teve sorte. Ou ela é que teve. Ou tiveram os dois. São coisas do universo. Onde é que eu ía? Nos cheques. Que maçada. Ora bem. Então quando fui passar o cheque reparei em algo que não tinha reparado e que me intrigou imenso. O cheque tem validade. O cheque tem validade? Ora esta!? Pensei eu. Mas como é que um cheque tem validade? Não tinham, antigamente. Eu se bem me lembro os cheques não tinham validade. Um cheque era um cheque. A gente guardava-os numa bolsinha de plástico que o banco nos oferecia e pronto. Quando era necessário usáva-mo-los.

Tu queres ver que estes cheques vêm apetrechados com aqueles dispositivos que vemos nos filmes e que ao fim de um ano explodem? Só me faltava mais esta. Ainda me pega fogo à gaveta - à secretária - e à casa. Tu queres ver? Achei que não. Ainda cheirei os cheques. Talvez cheirassem mal. Talvez fosse isso. Passado um ano começavam a cheirar mal. Sei lá. Podia ser. Eles inventam cada coisa. Não me digas que não podia ser isso, queres ver? Mas não. Não cheiram mal. Então têm a validade de um ano porquê? Um cheque bancário tem validade assim como um bilhete da carris, ou um iogurte? Não faz sentido. Ó pá. Não me lixes. Não faz sentido. Não faz. Não!

Vou ao banco dar os cheques a cheirar à menina da caixa e perguntar-lhe se sente algum cheiro estranho nos meus cheques. Se puder tiro-lhe uma foto sem ela saber no exato momento em que estiver a cheirá-los, depois envio-te. Deve ser giro. Achas que eu sou maluco? Ai sim? Mas quem é que coloca validade num cheque? Só um maluco. Ou então espera... Se calhar não é maluco. Isso. Se calhar não é maluco. Se calhar... espera. Não acredito. Se calhar foi uma maneira de me afanar mais uns euros. Se eu não usar os cheques sou obrigado a comprar outros passado um ano. Tou tramado. Estas coisas aborrecem-me. A isto eu chamo roubar. A isto e a muitas outras coisas. Olha, por exemplo, aqueles espertos que puseram o dinheiro no banco à espera de ganhar com aplicações de "retorno absoluto". Retorno absoluto! Pelo amor de Deus, mas havia de ser retorno quê? Eu nem entendo o que é que isso quer dizer. E agora estão tristissimos porque perderam o dinheiro, ou ganhou vida e fugiu. Que estupidez. E agora querem que eu, através do Estado, gerido por aqueles tipos que nós bem sabemos, contribua para lhes devolver o dinheiro. Porra pá tá tudo maluco. Ou não. Sei lá. Que maçada.

Beijinhos e essas coisas,

o normal anormal

A Almofada RICOXETE, o Caim do Saramago e o Pai Natal

A questão põe-se: o que é que estas três coisas têm a ver umas com as outras? E por incrível que pareça têm imensa coisa a ver. Ora vejamos,

À Saramago...


De cada vez que alguém quer uma Almofada RICOXETE eu próprio as vou levar aos CTT para serem enviadas, certo? Às vezes tenho de estar à espera. E enquanto espero e não espero tenho lido o livro do Saramago "Caim". Está lá na prateleira dos CTT. Eu até já vou na página 74. À borla. :-) O "Memorial do Convento" foi o primeiro que li. Mas só li até meio que aquilo é pesado. Tenho cá a ideia que o José... Saramago, terá experimentado algo do género: e se eu escrevesse assim tudo de fio a pavio? Pois bem, comigo não resultou. Mas depois e já nem me lembro bem porquê deu-me para tentar ler o "Ensaio sobre a lucidez". É pá, granda livro, ele é o maior. E logo a seguir li o "Ensaio sobre a cegueira". Ele é mesmo o maior pensei eu. Não haja duvida. Ainda me espanta o facto de terem feito um filme, que não vi, sobre o "Ensaio sobre a cegueira" e não sobre o "Ensaio sobre a lucidez". Talvez seja do meu feitio mas como tenho uma imaginação fértil não me surpreendeu tanto imaginar que se ficassemos todos ceguinhos isto era uma loucura total. Sempre fiquei com a ideia de que o hospital citado no livro é o da Avenida do Brasil, 53, em Lisboa, salvo erro. O dos malucos. Tás a ver? Não sei porquê mas dá-me cá ideia que ele se inspirou naquele lugar precisamente. Adiante. Agora o "Ensaio sobre a lucidez" isso já me foi mais surpreendente. A sério! E se houvesse eleições e votássemos todos em branco? Todos! Isso é que a minha imaginação já não vai tão longe. Política. Deve ser por isso. Mas o facto é que o José fez esse ensaio e eu achei brilhante. O poder desprovido de poder.Parecem uma galinhas tontas a disparar para todos os lados enquanto que nós continuamos sem que nada se pareça, e friso pareça, passar. É bestial. A maneira simples como ele vê a coisa. E faz-me algum sentido. É um bom ensaio. Gostava de poder falar com ele. Ó como eu gostaría... Isso é que era. Dava o corpinho todo para poder conversar com tal ancião durante uma hora. Não li "A viagem do elefante". Não me apeteceu. Se calhar ainda o vou ler. É pequenito. Lê-se bem. Ainda estive com ele na mão, mas depois de ler as primeiras linhas não me inspirou. Não sei porquê. São coisas. Nesse dia comprei um sobre o Obama. Quis perceber quem ele era. Comprei um livro de um tipo ecenomista português que fala sobre ele. Enfim... um europeu, português a mandar bitaites sobre o primeiro presidente preto dos Estados Unidos da América do Norte. Quem não deu. Até eu. Depois comprei e estou a ler outro sobre a China em África. E apercebi-me que estávamos todos a dormir. Os chineses já lá estão e de lá já ninguém os tira. C'est la vie. Eles são assim. Não se sabem rir nem dançar. Só sabem trabalhar. O que se há-de fazer? A China já acordou e recomenda-se. Adiante... Portugal está mal? Então e os Estados Unidos da América do Norte? 20 por cento da divida externa dos EUA pertencem à China? Nunca mais lhe vão conseguir pagar. Eu quero ver. Vais ser giro vai. Ora portanto fica o "Caim". E de tudo o que ouvi, e ouvi muitas coisas, ficou-me no ouvido um deputado português, pasme-se ou não, que disse sem papas na lingua que não leu nem vai ler e que o tal senhor, o José deveria ser banido da nacionalidade portuguesa. Dever-se-ía ter aberto uma cova naquele preciso momento dali até à China e ele ir para lá dar com os costados e trabalhar o resto da vida dele a cozer botões de camisas mas só nas mangas. Sinceramente. Que tipo mais... mais... mais... sei lá... olha! Palhaço. É isso. Palhaço! Como escreve o Mário Crespo e muito bem no Jornal de Notícias. Tanta polémica. Credo. Um livrito. Um livrito de nada. Uma outra visão da mesma história. Atenção que isto é a minha opinião e vale pelo que vale. Mas à terceira página vi-me a rir na estação dos CTT enquanto ía lendo a falulosa descrição do Éden. Lembras-te das instruções que íam incluídas na Almofada? Ía lá uma história da Maria (já nem sei se hei-de escrever história ou estória. Credo!) Ela tinha oito anos na altura. Agora já tem onze. É a minha filha. Uma pessoa perspicaz e sensível e que de quando em quando escreve umas coisas. E que me disse ainda ontem enquanto carregava cinco ou mais quilos de livros às costas no caminho para a escola (vá lá que ainda não a obrigaram a levar também o Magalhães às costas juntamente com os livros - tá tudo maluco - o Medina é que tem razão mas dizem que não que ele é tolo, valha-me deus), que o Natal é uma chatice pois as pessoas oferecem-lhe coisas que ela não precisa e que às vezes não servem para nada. Ela lá sabe. Mas eu vou oferecer-lhe o livro "Caim" do Saramago. Tem de ser. Ela vai ter de o ler. Eu quero que ela leia. Eu sou o pai. Eu é que sou responsável por parte da educação dela e portanto vou-lho oferecer e ela vai lê-lo. É por ser Natal? Talvez. Não sei. Que maçada... Ora bem. Até aqui fica a relação Almofadas RICOXETE e o livro "Caim" é obvia certo? E o Pai Natal? É pá! O Pai Natal é uma chatice. Eu não me sai da cabeça que foi uma campanha de marketing da Coca-Cola para venderem o dito refrigerante no Inverno, feita no fim do milénio passado. A coisa não só deu resultado como fez com que de repente aparecesse um tipo gordo de tanto se empanturrar de comida a conduzir um trenó puxado por renas e que voa e que entra pelas chaminés a distribuir presentes às crianças. O ano passado estava ele sentado numa cadeira do Centro Comercial do Chiado a fumar um cigarrinho. Peço-te desculpa. Peço mesmo. Não me leves a mal. Eu bem sei que é ofensivo. Bem sei que não havia necessidade. Mas p... que pariu o pai natal e a mãe natal e as renas e as árvores de natal e as bolas de natal e o natal e todas as coias relacionadas com o natal. Eu sei. Eu sei. Não devia pensar assim. Mas repara. Para mim é mesmo de facto natal todos os dias. Se tu me compraste uma ou mais Almofadas por ocasião do Natal não me interpretes mal. Nós agradecemos-te por isso mesmo. As mulheres e homens que estão presos neste preciso momento em que te escrevo este mail e que estarão eventualmente a fazer as Almofadas, fazem-nas durante todo o ano. Se fores lá e lhes perguntares se gostam do Natal imaginas o que te respondem? Pois. Não gostam e sentem-se muito tristes. Pensa bem. Não deve ser fácil. São pais, mães, avós, primas, tios, sobrinhos, estrangeiras e presos. E agora vai lá um tipo gordo vestido de vermelho dizer-lhes que é o pai natal e que lhes leva uns presentinhos que é um cartão de uma operadora com dez euros de chamas grátis e uma agenda e uma caneta. Bolas! Bolas! Bolas! Essas pessoas estão momentaneamente privadas da sua liberdade e como tal têm direitos (isto foi dito pelo Laborinho). Tiveram azar. Foram apanhadas. Tantos que por aí andam a pavonear-se. Bolas! O que é que eu digo aos meus filhos? Que o pai natal existe? Achas? Achas mesmo? Mesmo? Mas mesmo mesmo? Agora já não dá. Já lhes disse a verdade.

Beijinhos e essas coisas,

o normal anormal