quarta-feira, 9 de outubro de 2013

O masoquista


Há tempos a minha mãe que tem 70 anos e não obstante ser professora de Tai Chi Chuan, praticar ioga e até dançar tango, pasme-se, deu uma topada na canela, mesmo por cima do osso onde a pele é fininha, e ao chegar a minha casa mostrou-me com alguma preocupação a ferida já com três dias. De facto aquilo estava com um aspeto pouco normal, e sendo eu leigo na matéria e depois das tentativas goradas que ela levou a cabo para tratar com própolis e outros desinfetantes naturais o facto é que a ferida era grande e estava nitidamente infetada, demonstrando a violência da cacetada. Mas ela não se queixa, antes pelo contrário, que a minha mãe sendo pequena e leve é também uma espécie de formiguinha que nunca está quieta. Depois da minha humilde análise achei que seria melhor irmos à Clinica do Parque dos Poetas, que aquilo pertence ao BES e de certeza que tratam dela. “Não se esqueça do cartão Multicare!”, lembrei antes de irmos.

À saída e já cá fora a minha mãe comentou “Achas possível que a senhora que está no balcão possa ser a técnica de limpeza? Aquilo não são maneiras de atender uma pessoa.” Mal a mulher começou a fazer perguntas eu vim para a rua pensar numa alternativa. O “sistema” está tão obsoleto e organizado de tal modo que as pessoas são números, garantias bancárias ou de investimento. A minha mãe foi confrontada com uma espécie de muro de Berlim que divide a sociedade em dois, e conforme a perspetiva, cada um enquadra-se conforme tem mais ou menos capacidade ou falta dela para agir de acordo com as normas estabelecidas. Já não é uma mera questão de ter ou não ter dinheiro, mas antes uma questão de bom senso. Quando me ponho a analisar receio ser masoquista a julgar pelos recentes comentários do Exmo Sr. Presidente da República Portuguesa. Adiante…


Fomos então ao centro de enfermagem de Oeiras onde trabalha o enfermeiro Castro, que já tinha tratado o meu filho por ocasião de um dedo entalado na perna de recolher da cama de dormir. Um acontecimento que nenhum pai gosta de ver. Nessa altura e já em desespero foi o empregado da Farmácia que me indicou o dito enfermeiro Castro - um verdadeiro milagre, depois de me informarem no Centro de Saúde de Paço de Arcos que por motivos de morada não podem tratar de uma unha caída num dedo violentamente entalado de um miúdo de 11 anos. Mas pelos vistos há esperança, pessoas anónimas como o Sr. Castro mantêm uma estrutura paralela a funcionar que é uma luz de esperança contra o que parece ser uma epidemia de loucura transversal à sociedade. São organismos quase clandestinos e imunes a esquemas partidários ou de mercado e são uma resposta inteligente, prática e razoável às solicitações das pessoas comuns no seu dia-a-dia.

Por outro lado e num plano mais prático podiam trocar o Centro de Enfermagem pela Clinica do Parque dos Poetas. O enfermeiro Castro pela outra senhora e ficavam todos a ganhar, até o BES. Os que representam e defendem os mercados são perigosamente estúpidos e obtusos, não querendo dizer com isto que tenham falta de inteligência, antes pelo contrário que até inventaram uma ferramenta que lhes garante essa liberdade de movimentos – um elevadíssimo QI, seja lá o que isso possa significar. No caso do Exmo. Sr. Presidente da República, por exemplo e que até já foi professor e representa e muito bem o pensamento académico vigente, de seres humanos formatados para verem a vida contada em números, é óbvio que os analistas portugueses são masoquistas. Nada é eterno e estamos a presenciar uma revolução mundial. Vamos ver, vai ser extraordinário! De certezinha que o que resultar de tudo o que estamos a viver vai ser melhor do que o é agora. É sempre assim… Sempre!

Mesmo que a Exma esposa do Exmo Sr. Presidente da República ache que o vestido da Joana Vasconcelos seja muito interessante, eu também acho que eles os três são desprovidos que qualquer tipo de inteligência que não seja de facto o QI. Só pode!


Beijinhos