Há tempos li algures que a
verdade é aquilo que o maior número de pessoas acredita. De repente algumas
coisas que vou guardando na memória pareceram arrumar-se e algumas começaram a
fazer algum sentido. Veja-se este exemplo prático, redes sociais, algo extraordinário
que nos permite partilhar o que quer que seja, que nos permite ver e ouvir e
ler o que quer que seja, como por exemplo o caso do Carlos Cruz, o pedófilo.
Garanto-vos que é pedófilo pois foi o que a Justiça afirmou ao condená-lo
publicamente enviando-o (pelo próprio pé, não deixa de ser curioso) para o
Estabelecimento Prisional de Caxias. Vejamos, o Carlos Cruz é sobejamente
conhecido da população portuguesa e no entanto foram necessários anos, foram
necessárias folhas e folhas e mais folhas de papéis que diziam imensas coisas.
Foram necessárias pessoas, recursos humanos, tempo, dinheiro, mais tempo até
que a Justiça chegasse à conclusão de que o homem é de facto culpado. O homem
mais conhecido da televisão portuguesa. Durante anos e ao que a Justiça apurou
esteve envolvido numa rede que usava crianças da Casa Pia para orgias sexuais.
Neste espaço temporal em que
o Carlos é apanhado, após décadas de impunidade e finalmente, porque uma
jornalista assim o quis, até parece que o problema da pedofilia em Portugal
deixou de existir. Mas afinal e pela experiência por que passei, não! Afinal a
pedofilia existe e está de boa saúde e recomenda-se. E como é que eu sei isto?
Simples. Estava a trabalhar e tenho sempre as redes sociais que me apetece
abertas, e dou de caras com uma informação que pede urgentemente que eu
partilhe algo sinistro - uma entidade que se identifica como sendo um tipo que
pela foto diz que gosta de meninas e meninos muito novinhos. Aparece a foto
dele e depois no seu histórico muitas fotos de crianças com comentários do
género, “esta é mesmo boa” e outros que tais. Ora, eu que sou pai até neste
momento que estou a escrever isto me apercebo do tamanho da raiva que se
apodera de mim. É horrível! E no entanto… aquilo foi uma espécie de mensagem
virulenta. De repente um inúmero grupo de pessoas começou a pedir que se
fizesse alguma coisa. De repente começaram a aparecer pessoas que diziam que já
tinham reportado à polícia. De repente todas as pessoas começaram a dizer que
aquele fulano tinha de ser imediatamente parado e que por favor partilhem com
urgência. Não me admiraria que aparecesse nas notícias e tivesse um final
feliz.
Agora o final feliz é, e a
não ser que eu esteja mesmo a ficar doido, e a minha mãe também, que coitada me
vai escutando e não obstante diz-me que não, que eu não estou doido, também
talvez ela esteja doida e portanto um doido não pode dizer a outro doido que
não está doido… e vice-versa… ou, se calhar… como é que um tipo sozinho sabe
que está doido? Têm de haver duas pessoas certo? A sério, imaginemos duas
pessoas e uma diz para a outra “És maluco”, nós estando de fora pensamos o quê?
Eu penso logo que alguma coisa ali não está bem, mas de facto há pessoas que
pensam outras coisas. Extraordinárias!
Neste caso a rede social
funcionou na perfeição e pelos vistos as pessoas estão a aderir no sentido de
tentar apanhar o culpado da divulgação das fotos, que pela vontade que
observei, se o apanham é bem provável que tenham de o defender da populaça. A
não ser que, e foi o que eu sugeri, aquilo talvez não fosse realidade, que se
calhar a entidade não era o tipo que aparece identificado na foto, se calhar é
a foto de alguém que fez mal à namorada e agora está a sofrer as consequências
de uma mulher despeitada que perdendo a noção da própria vida, tira um curso de
informática nas Novas Oportunidades, promovido pelo Sócrates, e consegue
manipular com os poucos conhecimentos que tem, a rede social de tal modo que
colando fotos daqui e dali, com comentários obscenos, está a preparar a caminha
ao desgraçado que nem sonha o que lhe vai acontecer. Eu acredito mais nesta
história, mas claro, a maioria optou por acreditar sem qualquer sombra de
dúvida que aquela entidade, aquela foto de um tipo é que deve ser cruxificado
imediatamente. Eu entretanto, baniram-me. Apagaram-me. Talvez tivessem pensado
que eu estava a defender a entidade, sei lá. Vim sozinho para casa, não faz
mal, começo a estar habituado. Mas o curioso é que no caso do Carlos Cruz, eu
que me fartei de lembrar os meus amigos que ele ainda andava por aí a passear e
nunca mais ia preso, a dada altura comentaram “Olha lá, mas tu não falas de
outra coisa? É só Carlos Cruz, Carlos Cruz, até já chateia!”
Sendo a liberdade um
conceito utópico, eu falo e escrevo quando me apetecer e o que me apetecer.
Sempre e até morrer! Até por causa dos meus filhos...
Beijinhos