Há tempos o meu filho
Manuel, que curiosamente me tem ajudado a compreender-me a mim próprio tais são
as semelhanças de comportamento que me vejo nele, entalou o dedo na perna da
cama. Não obstante ter visto a irmã com um dedo lá entalado em outra ocasião e
ouvido da garganta dela um grito que espero nunca mais voltar a ouvir na vida.
Eu estava na cozinha e de um lapso de tempo para outro eu estava no quarto dela
com a cama no ar em peso enquanto ela olhava para o dedo que sangrava. Ser pai
pode ser curioso na medida em que nos faz reagir de uma determinada maneira ou
ter eventuais emoções que de outro modo não faço ideia de como se possam
sentir. Só tendo filhos de facto… e amá-los a sério, claro. Adiante.
Desta vez foi o Manuel,
coitado. Ele é forte, aliás eu já lhe pedi para ele se queixar com mais
antecedência em vez de aguentar até ao limite, ou para lá dele, pois se ele
sair a mim - aguenta-se muita coisa. Só que ele é meu filho e tem onze anos, é
diferente. Pois o Manuel entalou o dedo à séria, o polegar. Ó pá! Aquilo ficou
uma miséria, vai cair a unha e essas coisas. Mas ficou mesmo uma miséria,
credo. Nessa noite e de caminho para o hospital ele adormeceu, o que me levou a
pensar que se dorme é porque não será grave e talvez seja melhor dormir. Adormeceu
logo. No dia a seguir organizei o dia da maneira mais civilizada possível.
Ainda não conheço bem o “sistema” e fui à esquadra que já sabia onde ficava e
perguntei onde poderia ir com o miúdo tratar do dedo. Indicaram-me como é
lógico o centro de saúde da área da minha residência. Fiquei a saber que é
perto de minha casa, ótimo.
No centro da saúde de Paço
de Arcos disse ao Manuel para falar ele e ele mostrou o dedo ao senhor atrás do
balcão e explicou que o tinha entalado e precisava que alguém o visse. O senhor
perguntou-lhe onde é que ele morava e ele respondeu que mora em Telheiras com a
mãe. Faz sentido na medida em que é isso de facto que acontece quando não está
a viver comigo, o pai. O senhor informou o Manuel que não podia ser visto ali
pois o Manuel não reside em Paço de Arcos. Que tem de ir ao Lumiar. Ficámos
todos em silencio inclusive o senhor a quem eu fiz questão de dizer que o mais
certo era já ter morrido e nem saber. E que talvez ele não soubesse mas
devem-lhe ter tirado o cérebro e trocado por uma cassete igualzinha aquelas que
outros portugueses também usam em vez do cérebro, e que não era normal um homem
com aquela idade responder a uma criança de 11 anos que não lhe pode ver o dedo
a sangrar por causa da morada, quando o Manuel, sendo meu filho tem todo o
direito de ser atendido ali pois eu moro ali… espero que faça sentido o que
escrevi pois não é fácil resumir tanta estupidez junta.
Saímos do centro de saúde e
fomos à farmácia. O Manuel doía-lhe o dedo e aquilo de facto estava muito feio.
Na farmácia o rapaz do balcão sugeriu-nos irmos ao enfermeiro x (não escrevo o
nome para defender o dito enfermeiro não vá algum estúpido que trabalhe para o
“sistema”, se pôr com coisas). O enfermeiro x é um milagre! O dito homem, já
avô, tratou do Manuel como se do próprio neto se tratasse. Eu estava lá e vi. A
primeira pergunta que fez ao Manuel foi onde é que ele se tinha entalado e se
lhe doía e que ia já tratar do dedo e que não se preocupasse. Só me faltou
chorar. Eu não chorei mas o Manuel chorou um bocadito, coitado. Uma parte da
unha tinha-se partido e estava enterrada debaixo do resto da unha que irá cair
para dar lugar a uma nova. O enfermeiro fez-lhe festas, deu-lhe palmadinhas nas
costas, cumprimentou-me a mim e no fim disse que são quinze euros.
Eu paguei os quinze euros em
dinheiro vivo, não pedi recibo e já lá voltei para trocar o penso como
combinado e já está combinado outro penso dali a dias. O que é que o estado tem
a ver com isto? Nada! E espero que não se meta no assunto senão vou mesmo às
fuças a alguém. Comigo ainda podem “brincar” aos serviços de saúde, mas com o
meu filho não… por favor. Isto que se está a passar só não vê quem não quer. O
sistema gripou, faliu, desumanizou-se e agora estamos entregues a uns putos que
estão no governo a fazer experiências baseados em números e estatísticas.
Enfim… isto vai dar merda –
como se diz em português correto. Ou se não estiver correto não me levem a mal
mas eu às vezes até já nem sei escrever, tal é a confusão que os tais putos -
secretários de estado e afins, criaram inclusive com a língua portuguesa, como
se tal fosse possível… e até foi. Impressionante! Credo!
Beijinhos,
Parabéns!!
ResponderEliminarE chegaste aos 100 - Yupiiii ehehehehee
Muito bom!!
ResponderEliminarJá vi/vivi, filmes parecidos!!
Obg pela partilha e parabéns ao corajoso Manuel e ao pai, escritor;)