terça-feira, 4 de maio de 2010

O conteúdo dos altos quadros

Há tempos liguei a televisão. Faço-o com frequência. Umas vezes para ver as notícias, outras para ver algum filme ou série. Sem dúvida que a televisão me faz companhia. A minha televisão a julgar pelas novidades que vou observando aí por algumas grandes superfícies já é arcaica, mas enfim. Quando a ligo ela dá a imagem, menos mal. Podia de facto já ter adquirido uma outra, daquelas fininhas, mas não. Das vezes que fui indagar a qualidade e performances das ultimas novidades vim de lá com a sensação de que estava a ser atendido por um ser de outro planeta que falava uma linguagem que não a minha. É estranho. Não me sinto velho, apenas desactualizado.

Curiosamente esta minha sensação de desactualização vai-se agudizando à medida que me vou tentando actualizar. Talvez daí a minha não predisposição para ver certos e determinados programas televisivos em que os conteúdos eu não compreendo. A sério. Já não compreendo e pode ser que eu esteja completamente doido ou desfazado da realidade, que é uma hipótese a ter em consideração. Há dias liguei a televisão. Não me lembro quais os canais mas fiquei com a sensação de que finalmente percebo uma coisa. Quando oiço um desses “altos quadros” dizer que o que está a dar são os conteúdos, e ao olhar para a cara dele, não lhe vislumbro no olhar uma pontinha de creatividade, de cor, de imaginação, de honestidade, de humanidade. Aquilo é uma espécie de máquina que ali está em forma de pessoa engravatada a dissertar um discurso em que metade são palavras imperceptíveis e que só um punhado de pessoas conseguem de facto compreender, ou seja, mal ele começa a falar eu fico logo com a nítida sensação de que, mais uma vez, não vou perceber nada. O que me vale têm sido os meus filhos que me dizem que também não percebem nada do que estão a ouvir, e isso é perigoso pois dá-lhes uma enorme liberdade de acção.

Mas eu ando a tentar, de vez em quando, entender quais são estes novos conteúdos de que o tal “quadro” falava. Telenovelas portuguesas em que os homens choram a baba e ranho e as mulheres têm problemas de uma superficialidade indescrítivel. Eu a mim ninguém me tira da cabeça que quem escreve aqueles textos tem um coeficiente de inteligência capaz de fazer frente a um galinácio num campeonato de damas e mesmo assim perder sempre. É impressionante. Custa-me ver actores que eu até tinha uma relativa consideração contracenar com miudos de agências de modelos e que têm como duas melhores capacidade serem relativamente bonitos e conseguirem decorar textos. Valha-me Deus, eu estive a ver, a sério, parei para ver e aquilo é impressionante de tão mau que é. Mudo de canal.

Em três canais diferentes fala-se de futebol. Sempre os mesmos. Homens maduros, talvez com idade para serem avós ou não. Eu já nem sei se são políticos ou se são comentadores de futebol. Mas comentam jogos que já se realizaram. Daí e por uma questão de pormenor somos capazes de ver uma imagem andar para a frente, andar para trás, andar para a frente devagar, parar, andar para trás devagar, parar, voltar a andar para a frente, e para trás e outra vez para a frente, para que eles percebam se de facto o isqueiro é ou não devolvido ao público. Se não viste, não interessa. O que talvez seja curioso é que nas touradas as pessoas atiram coisas lá para dentro e eles devolvem com amabilidade.

Estou-me sempre a lembrar daquele político português pequenito que foi para o Parlamento Europeu dizer num minuto que Portugal não é um estado de direito e que não há liberdade de expressão. Nunca me lembro do nome dele mas dou-lhe o crédito de ter tido a coragem, ou estupidez, de o fazer. Por causa dele, também, agora é inquéritos uns atrás dos outros feitos por deputados que eu não conhecía e passei a conhecer, e a “quadros” que eu também não conhecía e passei a conhecer. Olha! Assim de repente e que me lembre soube que o avô de um dos inquiridos foi enterrado com a bandeira do FCP - curioso. E que outro ganhou no ano passado três milhões e meio de euros a trabalhar numa empresa com participação do estado.

Eu cá cheira-me é que há liberdade a mais, cheira-me. Mas como é Primavera ando para aqui afectado com a alergia e quem sabe não ando com o olfato todo trocado.

Beijinhos e essas coisas,

3 comentários:

  1. Não foi o Paulo Rangel que disse isso?

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  2. Isso, isso! Acho que se chama assim. É um pequenito gordalhufo. Até a Manuela Ferreira Leite veio para a televisão dizer que não era simpático votar nas pessoas pela aparência física. Tá tudo parvo.

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  3. Isso dos conteúdos é o que vem dentro dos pacotes, dos frascos, das embalagens.
    Se for um pacote de leite o conteúdo é leite, se for uma lata de sardinhas o conteúdo são as sardinhas, se for um frasco de feijão frade cozido o conteúdo é feijão frade.
    No caso da televisão os conteúdos são aquilo que estava lá dentro e que sai cá para fora pelo ecrã e pelos altifalantes, logo a lógica é ao contrário do normal!
    Normalmente anormal!

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