quarta-feira, 16 de maio de 2012

Bernardo Sassetti



Há tempos, passei um momento estranho na minha vida. Algo extraordinário que me tem feito pensar imenso sobre a vida. Não que eu não faça quase todos os dias mas de facto e por vezes acontecem-nos coisas que nos deixam assim meio letárgicos. Adiante… Eu já reconheço em mim esses momentos e quando me acontecem já sei por experiência própria que o melhor é esperar. O tempo, essa coisa também extraordinária, ajuda imenso. E deixá-lo passar sem nada fazer pode ser uma viagem.

Durante quatro anos acumulei moedas. Nem sei bem porque comecei a juntá-las mas o facto é que consegui acumular 7500 euros. Falei com os meus filhos e concordámos que não seria pior se em vez de irmos fazer a viagem que era o objectivo optássemos por adquirir uma viatura mais económica. Assim foi. Escolhemo-la e comprámo-la. Passados doze dias roubaram-nos o carrito novo. Ora bolas! Ficaram algumas fotos e a felicidade que esse carrito nos deu durantes alguns dias. No dia em que mo roubaram à porta de casa fartei-me de chorar. Cheguei mesmo a perder a vontade de estar de pé. Vá lá que me ficou a ideia de que sou uma pessoa persistente e perseverante. Acho que foi bom os meus filhos terem sentido isso. Que é possível acumular-se moedas a tal ponto que com isso se pode comprara um carro em vez de ir ao banco e prostituir-me. Simples.

Depois e num processo interno comecei a tentar arranjar explicações minimamente razoáveis para o que me sucedeu. Cheguei a imaginar o meu carro "velho" que felizmente ainda não tinha vendido ganhar vida, e com ciúmes atirar o novo ao rio. É que durante esses doze dias estacionei o carro “velho” mesmo em frente da porta do meu prédio, sendo que todos os dias ao sair de casa trocávamos olhares. Eu com a consciência pesada de me estar a desenvencilhar dele e ele (o carro “velho”), ali, parado, sem pestanejar a olhar fixamente para mim. Tal como naqueles filmes dos “Transformers”, ou lá o que é, o meu carro “velho” deve ter-se irritado e pronto, afogou o carro “novo”. Sei lá. É possível, não? Por outro lado e num registo mais espiritual, culpei Deus, esse incógnito de me ter feito tal coisa. Se Ele está em todo lado, certamente estava no local e no momento em que me roubaram o carro “novo”. É um mero raciocínio lógico. Foi Deus, pronto. É obvio que não foi o carro “velho” pois eu sei que as máquinas não têm vida… eu sei… acho… lembro-me quando era miúdo, olhar várias vezes para o Pinóquio na expectativa de o ver mexer. Fingia que estava distraído e de repente tentava apanhá-lo a mexer-se. Enfim… coisas de miúdos, claro… ou nem tanto… sei lá…


Passados alguns dias dá-se a morte trágica do Bernardo Sassetti (se não sabes quem é, afianço-te que é triste, pois se vivêssemos num país um pouco mais culto saberias de certeza de quem falo). Eu que até gosto de falar no facebook, que até andava mesmo triste por causa do furto do meu carrito “novo” até tenho vergonha de falar no assunto. A sério. Se me fosse possível eu daria de bom grado mais carros se isso trouxesse de volta o Bernardo e o que ele representava para mim. Um dia apanhei-o na rua e ofereci-lhe uma das nossas almofadas de caroços de cereja. Ia com a minha filha e fiz questão de lhe dizer que eu e a minha filha dançámos muitos ao som da música dele. Ela bebé, ao meu colo, com a cabeça encosta ao meu ombro, os dois a dançarmos o "Sonho dos Outros"... lindo. Ele não imagina como foi importante a música dele na minha vida. Principalmente a companhia que me fez em períodos mais conturbados da minha existência. Enfim... foi mesmo!

Há-de haver uma razão muito forte para teres levado o meu carro, mas o Bernardo? A sério Deus. Escuta… tenho uma proposta para ti. Levas-me o outro carro, o "velho" mas que está óptimo, afianço-te, e devolves-me o Bernardo, pode ser? Sei lá pá, pelos vistos gostas de carros e se calhar até gostas do meu carro “velho”. Se por alguma razão te ocorrer voltares a cometer a proeza de ressuscitares alguém pensa no Bernardo. A sério pá. Olha que fiquei muito triste contigo. Tantos que para aí há que só dizem e fazem disparates…

Quero lá saber do carro que até tenho vergonha da tristeza que senti por o ter perdido comparado com o Bernardo que esse sim me faz muita falta… muita mesmo! És uma besta Deus! Cada vez compreendo mais o Saramago e concordo com ele. És estúpido e filho de alguém que não sendo puta há-de andar triste contigo pois e a julgar pela história da humanidade olha que deixas muito a desejar. E depois ainda me vêm com a história das “Pegadas na Areia”, vão-se lixar todos vocês que aceitam isto como uma vontade de Deus... eu não!

Adeus Bernardo, até um dia destes…

Beijinhos,

3 comentários:

  1. Temos Normal Anormal de volta!!! Bem haja :)
    Fantástico como sempre

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  2. O mundo fica melhor quando escreves!!!
    Toma lá um abraço!!
    Leitecomgaz.blogspot.com

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  3. Confesso que me surpreendeste com este teu blog, Miguel, e acho que estiveste bem em alguns comentários, mas neste foste pouco feliz. Porque embora tenhas direito á indignação e tristeza pela perda de uma pessoa importante e talentosa como o Brenardo Sassetti, não acho que alguem que utilize um "lugar publico" tenha o direito de difamar Deus, e não só, da forma como o fizeste.
    O respeito é a base de uma sociedade, e decerto que este blog é visitado por pessoas religiosas ou não, que ainda assim acreditam em Deus.
    Tens Direito a ter opinião no assunto, no entanto não expor desta forma.
    Creio que podemos comparar esta situação com o caso do teu filho se ter aleijado na cama.
    O que acharias se alguem desconhecido e desconhecedor dos detalhes que levaram o teu filho a se aleijar, te culpasse pelo sucedido e afirmasse que tu es um pai de merda que não sabe cuidar do filho.
    Agora imagina que isso te chegava aos ouvidos, como reagias?
    "Eu vou á cara daquele gaijo", "Estupido, não sabe de todos os factos e culpa-me do sucedido", talvez raciocinasses.
    Sera que conheces todos os factos que levaram á morte do Bernardo, e se houve suicido, podes culpar Deus pelo sucedido?
    Vizinho.

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