segunda-feira, 16 de agosto de 2010

A garrafa de dois litros de coca-cola


Há tempos preparava-me para ir para a praia. Um convite feito por duas mulheres. Eu estava parvo mas pensei, “que se lixe, vou”. Vesti o fato de banho, uma t-shirt imaculadamente branca, meti a revista no saco da praia já pendurado ao ombro e vou à cozinha lembrando-me que na noite anterior tinha deixado uma garrafa de dois litros de coca-cola no congelar por sugestão de uns amigos que vieram cá jantar. Ora, a garrafa estava estranhamente rija e o conteúdo congelado. Com o saco a tiracolo poiso a garrafa em cima da mesa na cozinha e por momentos reflicto, talvez já tivesse visto aquilo assim, uma garrafa de coca-cola congelada. Agarrei-a com cautela. Estava mesmo rija. Tentei desapertar a tampa. Nada. "Bolas", pensei "esta coisa está mesmo agarrada". Poisei o saco da praia e agarrei numa toalha das mãos.

‎"Não há-de ser a porcaria de uma tampinha deste tamanho que me vai vergar". Agarrei na base da garrafa de dois litros de coca-cola com uma ponta da toalha e com a outra ponta atirei-me à tampa "Tás tramada!", pensei. Num golpe seco mas decidido fiz rodar a tampa. Não sei mas julgo que terá rodado um quarto de volta. Começo a ouvir um som parecido com o que faz o spray do mata moscas. Isto vai, pensei. Esperei mais um pouco, talvez três ou quatro segundos, e enquanto apurava a atenção no som sibilante que saía da tampa da garrafa que entretanto agarrava firmemente com a mão, dou-lhe mais um quarto de volta. Nada.

Curiosamente começei a ver bolhinhas a subir por entre o gelo. Eu sei que o que derrete primeiro é o concentrado a que chamam coca-cola. Uma espécie de caramelo liquido que, quando era novo, uma das primas usava para fazer de bronzeador. Enfim... cada um com a sua. No fim quem gozava era o namorado. Adiante. Ah! E como era açúcar se não fosse o namorado, saía facilmente com a água. Tem lógica. Mas como referia antes as bolhinhas começaram a subir pela garrafa e o som aumentou um pouco. "Isto são 14h30. Ora às 15h20 tou na praia. Isto hoje não vai estar vento", pensei.

Passados, o quê? Três? Dois? Sabe-se lá. O tempo por vezes é relativo. Naquele momento pareceu parar. Talvez por momentos tenha perdido de facto a noção do tempo. Talvez o cérebro se recuse a acompanhar o tempo na medida em que não quer registar determinado tipo de acontecimentos. Quando era novo, um dia roubei o carro aos meus pais e acordei no hospital com a cabeça envolta em gaze. O cérebro não registou esse acontecimento. Chamam-lhe traumatismo craneano. É curioso pois ele esteve sempre acordado. Dizem.

Pois bem. A dada altura algo aconteceu. Dava jeito ter uma daquelas máquinas de filmar especiais que filmam tão rápido que depois até podemos ver em câmara lenta. O facto é que o tal caramelo de repente está a ser projectado por toda a cozinha. Toda! Tudo tinha aquele açúcar caramelizado. Inclusive eu e a t-shirt branca. A projecção da coca-cola fez-se por toda a área da cozinha, inclusive locais que em teoria não seriam acessíveis à fúria da besta. Dentro da torradeira por exemplo. As torradas feitas no dia seguinte cheiravam a caramelo. Não é mau. Foi preciso arrastar o frigorífico, lavar os bicos do fogão, lavar o tecto com lixívia, e mesmo assim ficou todo manchado, "Que se lixe", pensei, "Ninguém olha para o tecto". E passadas duas horas de extenuante e contrariada esfrega lá me dirigi para a praia. Quando lá chegei olhei bem para a cara das pessoas com quem fui ter e lembrei-lhes, a sorrir, da garrafa de coca-cola que tinham sugerido colocar no congelador para ficar fresca mais rápido. Foi assim uma espécie de ‎... A culpa foi vossa, estão a ver?

Não saberei se o liquido caramelizado serve ou não como bronzeador pois mal chegei à praia atirei-me logo para a água. Mas deu-me a experiência conhecimento para saber que para além do cuidado a ter com garrafas de coca-cola de dois litros no congelador, se acontecer algo parecido como Armagedão na cozinha, no dia a seguir, o que ficou na garrafa não sabe a nada. Uma porcaria.

Beijinhos e essas coisas,

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